terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

CIGARRO.....COMO O FUMANTE SE VER ATUALMENTE?



Como alguém que sempre fumou , que teve esse hábito enaltecido , super aceito e reforçado pela sociedade se percebe nos dias de hoje ?
Fumar….o ato , o hábito , o vício de inspirar e expirar fumaça. O que será que leva o ser humano a praticar esse movimento durante tantos anos da sua existência? Que tipo de compensação o indivíduo esta fazendo com esse “objeto fálico” que solta fumaça?
 Lembro bem que nas décadas anteriores fumar era um movimento essencial para se fazer parte de uma sociedade moderna , quem fumava era elegante , bem relacionado , tinha um certo nível de diferença social e intelectual  perante aquele que não fumava. Fumar era uma espécie de iniciação social, era um quesito básico para você ser bem visto no meio ao qual estava inserido. Propagandas de televisão, fumar em restaurantes , aviões ,ver  o cigarro estampado em carros de fórmula 1 era muito comum antigamente , o cigarro era presença garantida em qualquer evento noturno. Pois é… Os tempos mudaram, a promoção da saúde e a qualidade de vida mostraram que o cigarro é um vilão em potencial para destruir a saúde do ser humano a médio e longo pazo.
 O cigarro passou a ser abolido e o fumante a ser enchergado como alguém que  pratica uma sabotagem contra sua própria saúde. E agora? Como o fumante que se via anos atrás como um indivíduo “super moderno” e “antenado” por fumar se vê nos dias de hoje? Como fica a representação social de uma maioria psicológica que existia nos anos 70 e 80 e que atualmente se transformou em uma minoria psicológica que para fumar tem que se retirar de lugares e locais para não ser reprimido publicamente?

O hábito de fumar está muitas vezes ligado a uma forma de compensação, uma fala reprimida que é exacerbada através do tabagismo. A psicoterapia é uma forma altamente eficaz para ajudar e promover o autoconhecimento, mostrando a pessoa que existem formas mais apropriadas e autenticas consigo mesmo de resolver conflitos sem auto sabotar a própria saúde.
I. INTRODUÇÃO
O tabagismo (ato de fumar) existe há cerca de 1000 A.C. e foi introduzido na América do Norte pelos indígenas, sendo usado inicialmente como medicina alternativa ou milagrosa, antídoto para veneno de cobras e também em rituais religiosos, já que se acreditava que o fumo era algo milagroso e que deveria ser ofertado aos deuses.
O tabaco era usado como fumo em rituais de preparação dos indígenas antes de entrarem em algum tipo de combate com tribos rivais, antes das caçadas e em reuniões festivas. Devido ao bem estar que o uso do tabaco proporcionava aos índios, os pajés começaram a utilizar o fumo como um atributo medicinal.      O pajé usava a infusão das folhas de tabaco maceradas para cuidar de índios “nervosos” ou “possuídos pelos maus espíritos”.
Em 1532 já na civilização o tabaco foi usado em Paris com fins medicinais, onde era aplicado em forma de a inalação da fumaça do tabaco incinerado em clientes classificados como “nervosos”.  (CARVALHO 2000)
O boticário francês de nome Jean Nicot (daí o nome nicotina) que esteve nas Américas no ano de 1565 ficou curioso acerca do uso ritualístico do tabaco nas reuniões festivas, no uso preparatório para combates em épocas de guerra e particularmente com o uso “medicinal” em que os índios acreditavam e outros grupos usavam.
Jean pesquisou uma maneira de utilizar a fumaça do tabaco de outra forma que não fosse aspirá-la diretamente da sua combustão, desenvolveu então uma cola e um papel de combustão mais lenta e enrolou o tabaco macerado neste papel, facilitando assim a inalação do tabaco e aumentando o tempo de combustão do mesmo. Estava inventado o cigarro.  (CARVALHO C.M 2009)
A intenção de Jean Nicot era apenas espalhar bom humor de uma forma mais prática do que ter que fazer a combustão e inalar o tabaco. Era muito mais simples fazê-lo em um cigarrete.
Ainda de acordo com a mesma autora, fumar cigarro era raridade até o final do século XIV.
Em 1880, cerca de 58% dos usuários de tabaco eram mascadores de fumo, 38% fumavam charuto ou cachimbo, 3% cheiravam rapé e apenas 1% era fumante de cigarro. Nesse ano, o americano James A. Bonsack inventou uma máquina capaz de enrolar 200 cigarros por minuto, o que criou condições para o aparecimento da indústria.
Veio a distribuição de cigarros aos soldados nas trincheiras, durante a Primeira Guerra, e seu uso, que se achava restrito às camadas marginais das sociedades americana e européia, explodiu. Em 1900, o consumo anual americano era de cerca de dois bilhões de cigarros; em 1930, chegou a 200 bilhões.
As duas guerras mundiais que afrouxaram a oposição ao cigarro somada à urbanização acelerada, à criação do mercado de massa e à expansão do mercado de trabalho conseguiram criar as condições para que a epidemia do fumo se espalhasse pelo mundo reforçado pelo glamour de Hollywood, como um símbolo de modernidade.
A estratégia de rebater todas as evidências de que o cigarro provoca doenças mortais conseguiu assegurar aos fabricantes o direito de manter, por muitos anos, a propaganda do cigarro pelos meios de comunicação de massa, com mensagens dirigidas a adolescentes, concebidas para aliciá-los à escravidão da dependência de nicotina.
Nos dias de hoje, esse tipo de aliciamento é criminoso e se faz sentir especialmente nos países em desenvolvimento, nos quais a defesa da saúde pública ensaia os primeiros passos e a vida humana parece valer menos. Conformada com a perda de mercado nos países industrializados, a indústria do fumo tenta de todas as maneiras conquistar novos dependentes nos países pobres.
 Aqui no Brasil, apesar do avanço inegável dos últimos anos, a adoção de medidas restritivas à publicidade do cigarro aconteceu com 30 anos de atraso em relação aos Estados Unidos.
Desde 1971, é proibido anunciar cigarro na TV americana; no Brasil, a proibição foi feita há pouco mais de uma década. Durante 30 anos, a mídia foi nos bombardeando com mensagens para induzir cada vez mais as pessoas a fumar, enquanto a mídia americana era protegida pela legislação de seu país.
A autora toca num ponto quase nunca lembrado, mas absolutamente fundamental para entender qualquer dependência química, ela menciona que o usuário sente prazer ao consumir a droga.
No caso da nicotina, esse prazer está ligado à sua interação imediata com receptores dos neurônios situados em áreas do cérebro associadas às sensações de prazer e de recompensa e à busca da repetição do estímulo que provocou o prazer.
Se um cigarro for consumido em dez tragadas, o cérebro do fumante que fuma um maço por dia verá esse circuito repetir-se 73 mil vezes por ano. Que outra droga provoca 73 mil impactos de prazer em um ano? Essa é a resposta à dificuldade enfrentada pelos 80% ou mais dos que fracassam na tentativa de abandonar o cigarro.
Nela está a explicação da dificuldade ser maior em largar o cigarro do que o álcool, a maconha, a cocaína, a heroína, ou o crack.
Apesar da controvérsia, o consumo do tabaco se espalhou pelo mundo em poucos séculos.  A progressão de doenças resultantes do habito de fumar (o fumo é responsável por 95% dos casos de câncer de boca; 90% das inflamações de mama; 80% da incidência de câncer no pulmão; 97% dos casos de câncer da laringe 50% dos casos de câncer de pele e 45% das mortes por doença coronariana) e a chamada promoção da saúde, do bem estar e do culto ao corpo fizeram a mídia mudar sua postura perante o uso do cigarro em 100%.Segundo o Instituto Nacional do Câncer, uma pesquisa nacional, realizada no ano de 2003, aponta que 1/3 da população é fumante, sendo 60% do sexo masculino e 40% do sexo feminino.
Estima-se que a mortalidade, decorrente do uso do tabaco, está em 200 mil mortes ao ano.
Entre as regiões brasileiras, o sudeste ocupa o primeiro lugar de uso do tabagismo com 42% de seus habitantes fumantes (INSTITUTO NACIONAL DO CANCER 2006).
Há cerca de duas décadas, o fumante era visto como um personagem social. O ato de fumar era um fator social que o deslocava de uma camada social outra já que o cigarro era visto como um sinal de que o indivíduo pertencia a um grupo restrito de pessoas que tinha uma ampla aceitação da sociedade como um todo.
Esse fato que sempre foi reforçado pela mídia com propaganda de cigarros feita livremente e a união da imagem do cigarro ao esporte.
Porém, de acordo com Carvalho (2000), o culto ao corpo, a promoção da saude e o notório malefício que o ato de fumar causa ao corpo humano mudaram esse estigma social fazendo com que de fato a situação se revertesse por completo em relação às representações sociais que o ato de fumar exerce na comtemporaneidade.
 O fumante passou a ser visto com certo repúdio, como alguém que precisa de tratamento para largar o vício. A mídia deixou de divulgar, por decreto do governo federal, qualquer tipo de propaganda que incentive o uso do cigarro e desvinculou qualquer ligação do cigarro com o bem-estar e ascenção social ou com a saúde e a prática de esportes. Com essa drástica mudança ocorrida nos últimos anos, o fumante que até então era visto com um determinado acolhimento social e pertencente a um grupo de certa forma elitizado passou a ser, de certa forma, descaracterizado e até mesmo excluso de determinados meios.
O fumante que antes tinha em lugares públicos seu lugar demarcado para fumar e poder se reunir com seu grupo social atualmente é excluído, pois a grande maioria dos estabelecimentos não permite fumantes em seu recinto comum. O maço de cigarros que era um motivo de orgulho do fumante que fazia questão de deixá-lo exposto em cima de uma mesa, atualmente é motivo de vergonha e constrangimento, já que o governo impôs uma lei que faz com que todos os maços de cigarro tenham fotos chocantes que ilustrem os malefícios que o cigarro causa com o seu uso frequente.  (SOUZA 2006)
Tais mudanças geraram um deslocamento social vivido pelo fumante. As mudanças de conceitos sociais do ato de fumar levaram a uma crise de identidade dos mesmos, já que por hora eram plenamente aceitos e em um curto período de tempo a situação foi mudada por completo.
1. As Representações sociais
Há numerosas ciências que estudam a maneira como as pessoas tratam, distribuem e representam o conhecimento. Mas o estudo sobre como e por que as pessoas partilham esse conhecimento, como constituem a sua realidade comum e de como transformam idéias em prática é o problema especifico da psicologia social.
Segundo Moscovici (2005), as representações sociais são objetos quase tangíveis. Elas circulam, se entrecruzam e se cristalizam continuamente, através de uma palavra, de um gesto ou até mesmo de uma reunião em nosso mundo cotidiano. Elas impregnam a maioria de nossas relações estabelecidas, os objetos que nós produzimos ou consumimos e as comunicações que estabelecemos, é a reprodução de uma percepção anterior ao do conteúdo do pensamento.
Moscovici (2005) diz ainda que:
 “Nós sabemos que elas correspondem de um lado à prática específica que produz essa substância, do mesmo modo como a ciência ou o mito correspondem a uma prática científica ou mítica”. (pág 31-32)
A Teoria das Representações Sociais objetiva explicar a interação indivíduo e sociedade e os diversos simbolismos por ela produzidos. Dessa forma, ela abrange o estudo de uma construção de saber cultural, desde as camadas mais individuais até as relações mais amplas. (Rateau 2004)
Uma de suas finalidades é trazer ao conhecimento algo não familiar, dando uma alternativa de classificação, categorização e nomeação de novos acontecimentos e idéias. Desse modo, possibilita a compreensão e manipulação destes a partir de idéias, valores e teorias já internalizadas e amplamente aceitas pela sociedade.
Podemos compreender, então, as representações sociais como simbolismos que criamos para compreender algo e torná-lo familiar, conhecido, o que nos tira do lugar de estranhamento e supera o problema. Assim, o que antes parecia inatingível e incompreensível vai se integrando à nossa bagagem cultural, e passa a estar ao nosso alcance, quando já familiarizados. Através delas nos organizamos no mundo e nos relacionamos com os outros, integrando o que sabemos e como vivemos e interagimos.
Nesse contexto, as constantes novas informações que recebemos no dia-a-dia são transformadas e trazidas para junto do que já temos conhecimento e passam a influenciar nossos valores, a nossa visão do outro e nossa forma de nos relacionarmos. Todo esse mecanismo tem a função de nos manter em uma “zona de segurança”, na qual compreendemos o modo como os objetos, as pessoas e o mundo funcionam.
Diante da teoria escolhida, podemos observar o modo como o fumante era enaltecido, exatamente por fazer parte de um nicho seleto de pessoas que se identificavam entre si, a mídia que reforçava essa condição positiva e glamurosa do ato de fumar entre as pessoas, proporcionando uma imagem de que o cigarro trazia benefícios sociais e prazerosos que de certa forma compensavam os malefícios causados pelo tabagismo e a forma como esse paradigma foi sendo alterado progressivamente com o passar dos anos.
Esse indivíduo social foi severamente restrito a exercer seu vício longe dos “bons olhos” da mídia e totalmente avesso daquele padrão seleto que existia antes.
É exatamente sobre as consequências dessa reestruturação que trata o interesse dessa pesquisa, o interesse de compreender um ator social que antes era aplaudido e atualmente se vê como alguém submetido a um vício, passivo e desconsiderado em um mundo social transformado e novo, onde se encontra inserido com uma nova identidade padrões a serem reformulados.